domingo, 28 de junho de 2009
Tanto caminho, tanto caminho...
Uma casa que fosse um areal
deserto; que nem casa fosse;
só um lugar
onde o lume foi aceso, e à sua roda
se sentou a alegria; e aqueceu
as mãos; e partiu porque tinha
um destino; coisa simples
e pouca, mas destino:
crescer como árvore, resistir
ao vento, ao rigor da invernia,
e certa manhã sentir os passos
de abril
ou, quem sabe?, a floração
dos ramos, que pareciam
secos, e de novo estremecem
com o repentino canto da cotovia.
Eugénio de Andrade
O Caminho...
Partida para o oriente
Tao
A poesia das partidas
sábado, 27 de junho de 2009
Tempos interessantes
O movimento...
A vizinha do quarto andar sabe que vou viajar e perguntou-me se eu não me cansava do movimento, fez a pergunta sem conseguir evitar um tom de reprovação gentil, a condescendência dos anos perante a inquietude dos mais novos, queria responder-lhe, mas pensei se era possível estar quieto como uma rocha, não será o movimento a natureza fundamental das coisas e todo o carácter estático dos objectos apenas uma ilusão, Heraclito dizia há dois mil anos que não podes tomar banho duas vezes no mesmo rio, que tudo é devir, Buda há mais tempo dizia que tudo é impermanência e vazio, se eu ficasse quieto e não lhe respondesse não continuaria o meu coração em movimento, e se este parasse não seria a minha quietude traída pelos ponteiros do meu relógio, deste e de todos os relógios do mundo que nos impedem de ficarmos quietos no passado, mundo este que cruza o espaço a velocidades inimagináveis com todos os outros planetas e estrelas, posso olhar para uma cadeira e pensar que ela está quieta mas se eu lhe deitar fogo não se transformará ela em cinza, como é que algo que não consegue permanecer pode estar quieto, toda a minha vida estive em movimento e quando morrer não vou parar porque não posso, porque me vou transformar em terra ou em fumo, e depois noutras tantas coisas como árvores ou nuvens, nem sequer as rochas estão quietas, elas movem-se só que muito devagarinho, tudo é movimento, é a nossa natureza fundamental, por isso sorri-lhe e disse, não, não me canso, e fui-me embora...
sexta-feira, 26 de junho de 2009
O espírito do viajante...
Não se pode ver, sem se aprender a ver
This is very different from Western religion and philosophy, which has tended to start with overall speculation about the nature of things (metaphysics) or the nature of God and has then developed an idea of the self to fit those existing ideas.
Ironically, it is modern science that has shown the folly of that approach. It recognises that an understanding of the world is always shaped by the ways in which we perceive it: we cannot get a truly "objective" view of anything.
In other words, we understand the world only by means of our own consciousness. Hence, if we do not appreciate how we look at things, we will never understand the things we are seeing»
Mel Thompson in Philosophy of Mind
terça-feira, 23 de junho de 2009
Partir...
Que nos protege e ajuda a viver.
Serenos transponhamos espaço após espaço,
Não nos prendendo a nenhum como a um lar;
Ser-nos corrente ou parada não quer o espírito do mundo
Mas de degrau em degrau elevar-nos e aumentar-nos.
Mal nos habituamos a um círculo de vida,
Íntimos, ameaça-nos o torpor;
Só aquele que está pronto a partir e parte
Se furtará à paralisia dos hábitos.»
Hermann Hesse