sábado, 29 de agosto de 2009

The End !

O Sol tambem se põe...

... no país do Sol nascente. Estou de volta à China. Deixei Hong Kong para trás, e estou de novo em Xangai, que se prepara para a sua "Expo 2010"... É o fim desta viagem e o fim de um grande "círculo" pelo reino do meio. Foram seis semanas de experiências intensas e inesquecíveis, e de aprendizagem sobre uma cultura que desconhecia... O meu avião parte daqui a pouco e graças à rotação da terra ainda chego no mesmo dia. Para mim o prazer de partir numa viagem destas, só é comparável ao prazer de voltar. Gosto muito de voltar. À minha casa, à minha família, aos meus amigos... Quero agradecer a todos os que me enviaram um email. Gostei de todos, mesmo que fossem só para dizer ola... Costumo dizer que numa viagem há sempre três fases: A antecipação, a viagem em si, e a memória. Este Blog termina aqui e fica para a memória...

Beijos e Abraços a todos. Vemo-nos em Lisboa ou em Leiria...

Zai Jian :-)

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Os chineses

Após esta viagem na China, posso dizer sem hesitar que gosto dos chineses... É óbvio que não foi tempo suficiente para compreender uma cultura com 5000 anos, mas foi tempo suficiente para acumular um conjunto de experiências, que me permitem ter uma visão pessoal.

Os chineses como todas as culturas (e pessoas) têm coisas boas e coisas más... Talvez as coisas más se possam resumir com aquilo que eu chamaria de "imaturidade civilizacional"...

O chinês típico, não gosta de respeitar filas, sejam elas para o que forem, não empurram, mas se houver uma aberta, lá se vai o teu lugar...

O chinês típico gosta de atirar lixo para todo o lado menos para o caixote. Um chinês num autocarro, tem um caixote do lixo do lado direito e uma janela aberta do lado esquerdo. Para onde é que vai a garrafa de plástico, de vidro, ou embalagens de toda a espécie? Pela janela é claro. O caixote do lixo servirá provavelmente para cuspir...

O chinês típico gosta muito de cuspir. E não são aquelas cuspidelas distraídas, mas grandes e sonoros escarros... É preciso ter cuidado quando se pousa a mochila no chão, porque são piores que a pastilha elástica. Este é provavelmente o único país do mundo onde nos monumentos nacionais existe para além dos sinais de proibido fumar e proibido vazar lixo, um sinal de proibido, com um boneco a cuspir...

O trânsito é absolutamente caótico e segue as regras do salve-se quem puder. Para conduzir na China, a buzina é tão importante como o motor ou as rodas. É necessário estar sempre a buzinar, para se ter a certeza de ser visto.

Um táxi segue atrás de um camião, numa estrada com um duplo traço contínuo. O que é que ele faz? Primeiro põe o pisca (porque é importante colocar o pisca, quando se vai pisar um duplo traço contínuo) e ultrapassa a buzinar sem parar, para ter a certeza que os carros que vêm de frente se vão desviar... Nem quero imaginar como é que se resolve um acidente na China, porque se é perfeitamente natural um carro andar na rua sem matrícula, é fácil perceber como andarão os seguros...

Mas o chinês típico também tem coisas muito boas... Para começar eles são muito simpáticos e abertos com os estrangeiros. E, não é só aquela simpatia de circunstancia, ou comercial, é mesmo genuína... Mesmo com a barreira da língua tive inúmeras experiências que me comprovaram isso.

Três adolescentes chineses num tour onde eu sou o único estrangeiro. Eles não querem tirar fotografias apenas aos monumentos, querem tirar fotografias à vez comigo! É como se o estrangeiro para eles fosse tão interessante como aquilo que foram ver. E isto foi me confirmado por outros ocidentais a quem aconteceu o mesmo...

Numa viagem de comboio tento comprar alguma coisa para comer a uma vendedora de rua numa estação, ela não tem troco da minha nota de 100, pois o chinês que viajava ao meu lado, sem me conhecer de lado nenhum, paga-me o almoço! Eu uso o livro de vocabulário essencial para lhe dizer que lhe pago de volta quando conseguir trocar a nota e ele usa o mesmo livro para me dizer "meishi". Não há problema é por conta da casa!

O chinês típico é reservado. Não te aborda se não tiver razão para isso, mas se mostras alguma abertura, é só simpatias. Numa viagem de comboio uma pequena chinesa de 8 anos, debate-se com um cubo mágico. Como sei os números, proponho ensinar-lhe alguns algoritmos. "primeiro rodas para este lado, yi, er, san, si, wu. Agora rodas para trás, liu, qi, ba, jiu". Quando ela viu o cubo feito, tornei-me o seu herói e de toda a carruagem. Passaram a viagem a oferecer-me ameixas, frutos secos e sorrisos...

Outra forma que encontrei para demonstrar abertura foi usar t-shirts com símbolos chineses. Comprei uma t-shirt no templo de Shaolin que foi um sucesso! Cada vez que a vestia, tinha pessoas a meterem-se comigo e a fazerem os gestos do Kung Fu...

O chinês típico gosta de apreciar a vida e gosta de jogar. Nos parques, nas ruas, nas casas de chá, os chineses, a qualquer dia da semana, jogam cartas, xadrez ou majhong, cantam, dançam ou tocam instrumentos tradicionais, praticam taichi ou simplesmente bebem chá e trocam mexericos. O chá é algo de tão cultural, que é perfeitamente comum ver um chinês a carreguar um pequeno termo com folhas lá dentro. Todos os sítios públicos, como as estações de autocarro, de comboio, ou parques têm torneiras de água quente, para garantir que, ao chinês, nunca se lhe acaba o chá...

O chinês típico é pontual. Os comboios ou os autocarros não saem às 10h ou às 17h. Saem às 10h18 ou 17h04. E quem pensa que eles estão a brincar, experimente não estar lá dentro a horas e verá que fica em terra. Não são só os transportes públicos, é cultural. Num tour, o condutor de um autocarro, quando parava num sítio dizia, "às tantas horas, aqui." Dezenas de pessoas e ninguém se atrasava. E se alguém se atrasava 5 minutos por alguma razão vinha a pedir mil desculpas...

O chinês típico é social. Por exemplo, para o chinês, comer, não é apenas satisfazer uma necessidade básica, é um acto social. Pode ser intimidante para uma pessoa entrar num restaurante chinês, porque não há mesas para dois, ou para quatro. As mesas estão postas para oito, dez ou para mais, porque um chinês, quando vai comer, nunca vai sozinho mas leva toda a família... E com tantas oportunidades para comer, existem outras tantas para socializar. Comer é um acto tão social, que para um chinês, dizer "nî hao ma" (estás bom?) ou dizer "chi fan le ma" (já comeste?) é exactamente a mesma coisa...

É claro que quando falo dos chineses estou a falar da etnia maioritária, os han. Existem outras etnias como a tibetana ou os uigures. E estou a excluir Macau e Hong Kong que são realmente diferentes...

Tenho a impressão de que, assim como a China, está a passar por uma enorme transformação, também a sociedade chinesa o está. Nota-se uma grande diferença entre as gerações mais velhas, muito ligados às tradições, e à cultura e as gerações mais novas fascinadas com a modernidade... Para um chinês da nova geração estar na moda, é usar t-shirts com frases ocidentais. O problema é que as t-shirts são "made in china" por uma geração onde o inglês não era obrigatório na escola. Assim temos a andar na rua coisas escritas em chinglês como "no paint no gaing", "life better more live" ou "rear you fair"...

Mas não penso que esta abertura ao exterior, ou este fascínio com a modernidade possa descaracterizar uma cultura tão rica e tão diversa como a cultura chinesa. Creio que é apenas um reflexo das profundas transformações pelas quais a China está a passar. Quando a modernidade se instalar, e deixar de ser novidade, os chineses terão também eles muito para oferecer ao mundo...

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Soho, Hong Kong

A bordo do Star Ferry

O Star Ferry que liga a ilha de Hong Kong a Tsim Sha Tsui é uma instituição para os habitantes de Hong Kong. A funcionar desde 1888 era até aos anos 80 a única forma de transporte entre as ilhas. É um ícone cultural vivo, porque continua a funcionar...

Sinfonia da luzes

Ter um horizonte de arranha céus à beira de água não é original, Xangai também o tem... Mas colocá-los todos a dançar com luzes ao som da música, isso é de certeza um original de Hong Kong!

É o sonho de qualquer light jockey, "brincar" com uma cidade inteira... :-)

Hong Kong

Estou em Hong Kong e já deu para perceber que
Hong Kong e Macau, (que são chamadas pelo governo chinês de regiões administrativas especiais), são realmente especiais...

Para começar, uma semelhança entre Hong Kong e Macau é que são mais "civilizadas" que o resto da China. Os carros param nas passadeiras, é proibido fumar em recintos fechados, as ruas estão mais limpas, etc... As semelhanças entre Hong Kong e Macau continuam na medida em que ambas têm a sua fronteira, a sua moeda e os vestígios do seu passado colonial. Enquanto Macau mistura a cultura asiática, com a arquitectura de uma Lisboa antiga, Hong Kong mistura-a com os eléctricos e os autocarros de dois andares, tão característicos de Londres. Mas as semelhanças acabam aqui...

Macau tem uma atmosfera "histórica" (o centro de Macau é património da humanidade) enquanto que Hong Kong tem uma atmosfera muito mais moderna... Em Hong Kong os mega-casinos são substituídos pelos mega arranha céus. Se dissermos que Macau emula Las Vegas, Hong Kong emula Nova York ou outros centros financeiros internacionais.

Por causa desse aspecto de modernidade, o contraste entre a cultura asiática e a europeia, é mais acentuado em Hong Kong. No SoHo de Hong Kong, uma rua cheia de sinais luminosos chineses a anunciar a pequena ervanaria, a vendedora de fruta, ou o sapateiro, está rodeada por arranha céus de 50 andares...

Por aqui fala-se muito mais inglês, mas desconfio, que é porque há muito mais ingleses residentes por aqui, devido à actividade financeira. É vê-los à hora de almoço, a saírem das torres de vidro, com os seus fatos, gravatas, e as ruas raquetes de squash...

Parece também haver muito dinheiro por aqui, ou pelo menos é mais visível. É fácil ver na rua passar um Porshe, um Maserati ou outra extravagancia semelhante... Provavelmente devem ser os executivos de topo da AIG, ou do Citigroup, com os seus bonus chorudos, e que tambem têm as suas torres por aqui...

Bem vistas as coisas, Hong Kong e Macau são o par perfeito. Porque se é em Hong Kong que "fazem" o dinheiro, é em Macau que o vão gastar...

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

A torre de Macau...

... tem 339 metros, e maluquinhos a saltar no maior "Bungee Jump" do mundo! Eu sei que pertenco à categoria, mas desta vez deixei passar em branco... Foi por causa da chuva! Cof cof...

Cirque du Soleil, Zaia

Na segunda, assisti pela primeira vez a um espetáculo do Cirque du Soleil... Eles têm um palco permanente no Venetian. Eles são magníficos!

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

O Venetian

Até parece que estou em Veneza, mas estou no Venetian... Alguns números para se perceber a escala deste mega-casino. Mais de 1 milhão de metros quadrados. Só a lagoa tem 23500 metros quadrados ou o equivalente a 10 piscinas olímpicas. Trabalham cá permanentes cerca de 12000 pessoas e nos canais interiores estão 51 gondolas em permanente actividade...

Casino Lisboa...

... e o novo Grand Lisboa, que é simplesmente megalomeno! Com a sua arquitectura e a sua opulencia, domina completamente o centro de Macau.

Macau

Tenho de confessar, de que quando cheguei a Macau entusiasmei-me... Quando passei a fronteira na porta do cerco, os oficiais chineses carimbaram o meu passaporte como tendo saído da China, e depois vejo na fronteira de Macau a palavra "Entradas", e de repente tudo estava escrito em português...

Os táxis eram pretos com a capota verde ou beige, as matrículas dos automóveis tinham o formato das portuguesas mas começavam todas por "M", o meu pequeno almoço foi dois pastéis de nata, e um café, o meu almoço foi bacalhau à zé do pipo, os passeios eram as típicas calçadas portuguesas com desenhos de caravelas, fiquei alojado num pequeno hotel na Rua da Felicidade, uma paralela com a Avenida Almeida Ribeiro, enfim, parecia que já estava em casa...

No meu entusiasmo comecei a falar português para toda a gente. Para o homem do táxi, do hotel ou do restaurante. "Então, como vai? E a família tudo bem? Ola, eu sou o Rui, venho de Portugal". O que recebi foram olhos esbugalhados de quem não está a perceber nada, provavelmente os mesmos que eu faço, quando falam para mim em cantonês...

Macau parece português, mas não é... Talvez a metáfora perfeita para isso seja as ruínas de S. Paulo, o ícone turístico da cidade e que Macau usou como representação no seu pavilhão da Expo 98. As ruínas são da antiga Igreja de S.Paulo que foi destruída num incêndio e da qual só sobrou a fachada... Macau já só tem uma fachada portuguesa, o resto desapareceu na história...

E que história! É preciso admirar a audácia dos navegadores portugueses que aqui chegaram no século XVI. Chegaram à baía de A-Ma (em cantonês A-Ma Gau, que depois ficou Macau), para se protegerem de uma tempestade. A-Ma, é uma deusa local, que protege os homens do mar, e ela deve ter querido que os portugueses chegassem aqui... Aquilo que era apenas uma pequena aldeia de pescadores transformou-se no maior porto de trocas comerciais entre o Oriente e o Ocidente... A seda e o chá, já não precisavam de enfrentar os perigos do deserto nas caravanas de camelos, porque agora viajavam nos porões das caravelas portuguesas...

Hoje, Macau já não é nada disso. Hoje, Macau são os casinos. A ambição de Macau é tornar-se a Las Vegas do Oriente. E, pelo caminho que as coisas estão a tomar, muito brevemente, Las Vegas passará para segundo plano e será chamada Macau do ocidente... Por todo o lado se vêem mega-casinos em construção. Coisas absolutamente megalomenas, verdadeiras cidades artificiais como o "Venetian" que emula a cidade de Veneza...

Algumas cadeias norte americanas, de Las Vegas, também resolveram se instalar aqui, como a "MGM" e outros... Macau parece ter um futuro brilhante pela frente, ao se transformar numa espécie de "Cidade dos Sonhos" onde milhões são ganhos e perdidos ao som da roleta...

sábado, 22 de agosto de 2009

O enigma que não chegou a ser

Estranho ninguém ter ficado intrigado, com o facto de eu literalmente flutuar na paisagem de Yangshuo... Não, não eram efeitos especiais porque o meu telemóvel não dá para tanto, e não, ainda não aprendi a voar baixinho junto à copa das árvores. Aqui vai a resposta para o enigma que nunca chegou a ser...

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

20 Yuan

Há uma razão para a paisagem de Yangshuo ser famosa em toda a China... Esta é a imagem que aparece nas notas de 20 yuan. Isto significa que praticamente todos os chineses trazem um bilhete postal de Yangshuo no bolso.

Jogos de luzes

Yangshuo, apesar de ser pequeno e de ser o campo, é um lugar famoso na China. Talvez por isso atrai pessoas famosas. Quando ouvi dizer que o coreógrafo dos jogos olímpicos tinha montado aqui um espetáculo de luzes, é óbvio que eu tinha de ir ver...

As expectativas eram grandes por causa do autor, mas mesmo assim, foram totalmente cumpridas! O tema dos cenários, "pintados" com luzes era obviamente Yangshuo.

Achei o máximo, porque tudo aquilo que eu tinha visto no meu passeio de bicicleta, os pescadores, as jangadas de bamboo, os búfalos na água, as crianças à beira rio, os arrozais, com o fundo das montanhas típicas, aparecia estilizado com uma estética luminosa que transformava tudo em magia... E isso é arte!

Uma aventura...

Ontem (quinta-feira) aventurei-me... Quis ir explorar os arredores de Yangshuo, então aluguei a bicicleta mais "pro" da loja, uma TT cheia de mudanças, convencido que a bicicleta faria os quilómetros sozinha sem eu precisar de pedalar...

Como ponto de referencia resolvi seguir o rio. O caminho foi ficando cada vez mais estreitos até que deixou de haver caminho, apenas vegetação intransponivel. Por coincidência (ou não) havia nesse lugar uma velhinha com um barco. Perguntou-me se eu queria passar para o outro lado, e eu disse que sim, pensando que mais à frente encontraria uma ponte para passar novamente o rio...

Vários quilómetros depois, como não encontrava ponte,e farto de andar metido dentro dos arrozais, resolvi meter pela estrada, com a esperança de que na próxima povoação encontraria uma ponte. Má ideia...

Vinte quilómetros depois de uma estrada através da montanha, com subidas e descidas, e sem uma única sombra, cheguei novamente ao rio, queimado do sol, sem água, sem barcos e sem ponte...

Fiquei preso. Sentia-me exausto e sem forças para voltar para trás, e não era possível ir em frente. Então sentei-me à beira do rio a ver o tempo passar... Algum tempo depois, passou por ali um chinês a quem eu perguntei como fazer para passar para o outro lado...

Ele por gestos disse que ia chamar um amigo. Quando o amigo chegou, só trazia um remo, e eu perguntei-lhe onde estava o barco. Ele apontou para a margem do rio e foi então que vi ... Uma jangada de bamboo!

Comecei a ficar preocupado. O rio tinha corrente, a jangada tinha o aspecto de se partir mal saísse da margem, e era óbvio que ela não aguentaria com o peso de duas pessoas mais a bicicleta. No entanto, com sorrisos, lá me convenceu a subir...

Fui eu e a bicicleta em cima da jangada, e o amigo a nado a rebocá-la. Consegui finalmente passar o rio e fiz os quilómetros de volta para Yangshuo.

Quando cheguei, reparei que havia uma agência que oferecia a possibilidade de experimentar um passeio nas típicas jangadas de bamboo de Yangshuo. Comecei a sorrir... Mais típico do que a experiência que eu tinha acabado de ter, era impossível.:-)

Flutuando dentro de ...

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Imagens de sonho...

Fartei-me da cidade e fui para o campo... Estou em Yangshuo uma pequena vila a 100km de Guilin. Não há nada para fazer aqui, a não ser apreciar a paisagem, andar de bicicleta, ou sentar-me à beira rio, a ver o tempo passar devagar...

A razão pela qual estou aqui, é uma história que começou há muitos anos... Foi quando o meu pai comprou uma enciclopédia geográfica do Readers Digest. Como todas as enciclopédias, tinha todos os países do mundo (alguns dos quais já nem existem), informação estatística como capital, população, área, etc, e um pouco de história do país.

Muito antes de eu sonhar em viajar, eu fazia viagens de sonho dentro da enciclopédia mas a única coisa que ficou gravado na minha memória foram as fotografias que acompanhavam os países... De tal forma, que muito tempo depois, quando eu ouvia falar de um determinado país, a primeira coisa que vinha à memória era a fotografia dele na enciclopédia...

Assim, o Peru era Machu Pichu, a Namíbia era o deserto vermelho de Sossusvlei, a Índia era o Taj Mahal, a Indonésia eram os vulcões, o Cambodja era Angkor, etc... A China era: Uma imagem das colinas verdes de Yangshuo nos arredores de Guilin...

É fácil reconhecer que nas minhas viagens tenho andado a perseguir essas imagens. O objectivo é claro, transformar imagens de sonho em realidade... Dei-me conta no entanto de um facto curioso. A primeira coisa que faço quando estou frente a frente com a realidade, é apontar a objectiva, escolher a abertura, e "click!", transformo a realidade outra vez em sonho... Acho que há uma certa simetria nisto.

Por falar em tons...

Um trava-língua em chinês...

"sìshísì zhï, shíshïzî shì sîde"

(quarenta e quatro pedras, os leões estão mortos)

Leituras de viagens

Há um álbum dos Lamb que eu gosto muito, chamado "Fear of Fours". Foi só bastante tempo depois do álbum que descobri que são os chineses que têm medo do número 4... A razão é que muitas palavras em chinês diferem apenas no ton, e a palavra para o número 4 (sì) é muito parecida com a palavra morte (sî). Portanto um chinês tem medo do 4 porque pode enganar-se no ton e dizer, 1, 2, 3, morte...

Nesse álbum há uma faixa chamada "Bonfire" (fogueira) onde a Lou canta qualquer coisa como "You should burn like a good bonfire, in whatever you do..."

O que é que isto tem a ver com leituras de viagem?

Aqui vai um parágrafo do que estou a ler. Desculpem ser em inglês, mas não vou traduzir...

"In order not to leave any traces, when you do something, you should do it with your all body and mind; You should burn yourself completely, like a good bonfire, leaving no trace of yourself. Zen activity is activity wich is completely burned out, with nothing remaining but ashes. (...) Usualy when someone believes in a particular religion, his attitude becomes more and more a sharp angle pointing away from himself. In our way the point of the angle is always towards ourselves."

Shunryu Suzuki, in "Zen Mind, Beginners Mind".

Alguém é servido?

De um chá de folhas verdes de bamboo? É nos parques e nas casas de chá que se vê que o chinês gosta de apreciar a vida...

(E eu feito chinês, estava a apreciar tanto a vida, que ia perdendo o comboio!)

O maior... O maior...

A China é um país rico em superlativos. É o país mais populoso do mundo, tem a montanha mais alta do mundo, tem o lago mais alto do mundo, etc... É óbvio que tinha de ter o maior Buda do mundo... Esse Buda está em Leshan perto de Chengdu, e é realmente grande, com pés do tamanho de um autocarro, e 71 metros de altura, é uma visão impressionante... Foi criado com o objectivo de apaziguar o rio, e dizem que a rocha que tiveram de escavar da montanha para o criar, e que foi parar ao rio, realmente o apaziguou... Portanto resultado conseguido!

A ópera de Sichuan

No Sábado passado aproveitei o facto de ter voltado à "civilização" para ir ao teatro. Bom, não é bem um teatro, por aqui chamam-lhe a ópera, mas tambem não é uma ópera, hmm... É um espetáculo tradicional em vários actos. Inclui canto com fatos tradicionais, teatro, música, magia com máscaras, sombras com as mãos, fatos que mudam de forma e cor e cuspidores de fogo... Mas talvez o mais interessante é que aquela que fui ver se passou numa casa de chá... É preciso perceber a importância que o chá tem na cultura chinesa, para perceber a importância do cenário... A "arte" do chá tem mais de 3000 anos e talvez a província de Sichuan representa a cultura do chá melhor do que qualquer outro lugar na China... As casas de chá, eram o centro da vida social, onde as pessoas trocavam rumores, jogavam majhong, cortavam o cabelo, viam a ópera, limpavam a cera dos ouvidos, com os limpadores de cera de ouvidos profissionais (a sério, eles existem!!) e eventualmente bebiam chá... Esta era particularmente bonita, com grandes cadeiras de bamboo, e chá servido em grandes chaleiras com bicos compridos em chávenas de porcelana ... chinesa.

sábado, 15 de agosto de 2009

Anda cá pandazinha...

... vamos fazer ronron :-)

O panda kung fu

Chengdu é a terra do panda kung fu... Bem, não sei se esse panda em particular é daqui, mas os primos dele são de certeza. Existe aqui o maior centro de pesquisa e criação de pandas do mundo. (O que não é de admirar, porque o panda é endémico desta zona).

Quem me conhece sabe que eu tenho uma costela ecológica. Mas há ecologias e ecologias... Cuidar do nosso planeta é cuidar da nossa casa, sabendo que não temos mais nenhuma, e ninguém gosta de viver numa casa imunda e cheia de fumo... Mas a minha noção de ecologia é que devemos cuidar de ecosistemas em geral para além de espécies em particular...

Portanto é muito bonito cuidarem dos pandas em cativeiro, mas talvez fosse mais interessante não destruirem as florestas de bamboo que são o seu habitat natural...

No total existem cerca de 1000 pandas no mundo, e se não fossem os esforços de preservação ele provavelmente já estaria extinto...

Também não seria de admirar. É preciso vê-lo ao vivo para perceber o quão "urso" este animal é... Então eu estou neste clima de t-shirt a transpirar sem parar com a humidade, e ele usa um casaco de peles preto e branco!? Além disso resolveu especializar-se numa dieta de bamboo. Como as folhas de bamboo são muito pouco caloricas eles têm de passar todo o tempo a comer, nem sequer podem hibernar como os outros ursos senão morerriam de fome! Como se isto não bastasse, a cada 25 anos, enormes áreas das florestas de bamboo florescem e morrem e eles têm de migrar para outras áreas... Portanto é um animal que claramente se especializou demasiado. Agora veio o homem dar-lhe cabo das florestas de bamboo e eles obviamente vêem-se a caminho da extinção...

Ao vivo são como autênticos ursinhos de peluche. Muito doceis e brincalhões. Gostam muito de subir às árvores e cair aos trambolhões. Quando não estão a brincar estão a comer folhas de bamboo, como se elas não tivessem fim... Quem olhar directamente para os seus olhos parece ouvir dizer: Ola, eu sou um panda, por favor cuida de mim...

Um bom duche

Quando saímos das montanhas, o condutor resolveu dar um duche ao autocarro que estava transformado numa gigantesca bola de lama... Um adolescente chinês, que viajava no banco à minha frente ofereceu-me um toalhete higienico. Ele tinha passado a viagem a oferecer-me coisas. Primeiro foi tabaco, que gentilmente recusei (sim, pode-se fumar nos autocarros chineses, é o horror). Depois foi uma perna de frango frita, e seca, que gentilmente recusei. Ele olhou para mim, com um ar de quem pensa: Não percebo estes estrangeiros, mas quem é que recusa uma perna de frango frita e seca!? Enquanto lhe dava uma valente mordida. Quando aceitei o toalhete, ele percebeu que não era nada pessoal, apenas que eu não estava com (suficiente) fome. Quando passei o toalhete pela cara, ele ficou preto. Só aí é que me apercebi que também eu estava a precisar de um bom duche...

O caminho para Chengdu...

... foi particularmente difícil. Apesar da paisagem magnífica de verdes pastagens, de iaques, de tendas e de templos há um limite para o número de horas que isso satisfaz. Foram 820 km, e este tipo de estrada foi o melhor que tivemos! Durante a noite a estrada piorou para um nível tão péssimo, que chamar-lhe caminho de cabras seria um eufemismo. Nenhuma cabra com bom senso seria capaz de se aventurar ali... Tão mau, que a única coisa que eu pensava às 3h da manhã, era que não havia nenhuma forma de conseguirmos passar aquele mar de lama, e que as equipas de salvamento iriam demorar 1 mês a nos tirar dali... Mas conseguimos passar, e 30 horas (!!?) depois chegamos a Chengdu.

Dançarino em Yushu.

Talvez mais interessante que o dançarino seja o público que está a assistir.:-)

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

A sala secreta...

E' obvio mas tenho de o dizer, que este pequenos videos, (que tenho limitado a pouco mais de 15 segundos, por causa do Blogger que nao me deixa mais), nao conseguem nunca transmitir a sensacao que e' estar aqui...

As bandeiras de oracao tibetanas

Toda a montanha coberta como uma teia de aranha, absolutamente incrivel !

A caminho do templo da princesa...

... o taxista resolve parar e dar boleia a uma amiga, que se aconchegou ao lado dos suicos :) Nao se consegue ver muito bem, mas os fatos deles sao lindos, e trazem geralmente na mao uma especie de "guizo" de oracoes. E' como se fosse um terco do rosario cristao, mas tem uma parte que roda e eles rodam sempre no sentido dos ponteiros do relogio, que e' o mesmo sentido que eles circulam a volta dos templos... 

Yushu

Tenho de confessar que quando recebi os avisos de estradas más e cães vadios, pensei que estivessem a exagerar...

A viagem de Xining para Yushu foi medonha, e o pior nem sequer foi o caminho de cabras, no qual o autocarro se aventurava, mas o facto de toda a viagem ter sido feita, acima dos 4200 metros de altitude, com passagens aos 4800!

Apesar dos dois dias de aclimatizacão em Xining, a falta de oxigénio deu-me uma dor de cabeça enorme, que retirou um pouco do prazer de apreciar a paisagem. É no entanto uma paisagem magnífica, terras verdes de pastagem a perder de vista, com manadas de iaques, tendas de nomadas, e as típicas bandeiras de oração tibetanas... Felizmente Yushu fica a "apenas" 3600 metros e isso fez com que eu começasse a melhorar.

No primeiro dia em Yushu fui atacado por cães vadios e perseguido por um iaque... (Não, não estou a brincar). Os cães eram dois e estavam perto de um templo que fui visitar. Atiraram-se a mim a rosnar e a mostrar os dentes. Uma vez em Bali na Indonésia, aprendi à custa de uma mordidela sem gravidade que nunca se deve mostrar medo nem as costas a um cão vadio senão eles atacam. Então mostrei os dentes e comecei a rosnar também, ao mesmo tempo que recuava a ver se eles me largavam.

Infelizmente um deles parecia mais confiante e pronto a saltar, então institivamente dei um passo em frente e apliquei-lhe um valente pontapé no focinho (queria aqui, em primeira mão, pedir desculpa à sociedade protectora dos animais mas era ele ou eu). Ele partiu a ganir e o outro não fugiu, mas perdeu a vontade. Consegui portanto recuar e vir-me embora...

Quando ainda me estava a recompor do susto, vinha por uma viela estreita de Yushu quando ouço atrás de mim um - MUuu ! - virei-me e era um iaque a trote na minha direção. Ora eu não sei o que é suposto fazer com iaques! Então encostei-me à parede e ele passou por mim sem problemas. Afinal era ele a buzinar, tudo bem, melhor assim...

O segundo dia em Yushu foi bem melhor! Yushu é aquilo que eu esperava que fosse e mais ainda... É quase como se fosse outro país. Aqui a etnia dominante são os tibetanos com 97%. Os rostos são diferentes, a pele mais escura, os cabelos mais negros. Vê-se muitas pessoas com o fato tradicional na rua. Só que não estão a usá-lo por causa dos turistas porque não há turistas!

É mentira. Havia mais 3 turistas em Yushu. Eu sei, porque jantei com eles. Um casal de suíços de Genebra que conheci na viagem de autocarro, o Clement e a Charlotte, e um amigo deles que eles tinham conhecido em Xining. O Robert, um inglês que estava a viver há 10 anos em Hong Kong.

Na terça-feira, decidi partilhar um táxi com os suíços para irmos visitar o templo da princesa Wencheng, e tive oportunidade de assistir a uma das visões mais extraordinárias desta viagem... Toda a zona à volta em templo estava coberta por bandeiras de oração tibetanas que cobriam a montanha como uma gigantesca teia de aranha...

Na volta para Yushu, vimos um templo no topo de uma montanha do outro lado em rio que não estava referenciado no guia. Convencemos o taxista a nos levar lá. Quando chegamos o taxista falou com o monge que foi abrir o templo só para nós! Quando entramos nem queríamos acreditar nos nossos olhos. A sala de orações foi uma das mais belas que já vi nesta viagem. Estátuas douradas de Buda com vários metros de alto, paredes e tecto todos pintados com narrativas budistas coloridas, o cheiro a incenso... Estávamos os 3 com os queixos caídos, em exclamações de espanto, quando o monge nos convida para entrarmos numa porta lateral. Pensamos que nada podia igualar o que tínhamos acabado de ver. Seguimos o monge, como se fôssemos os salteadores da arca perdida. Atrás da sala de oração havia uma sala secreta com uma visão ainda mais extraordinária. Um Buda sentado com mais de uma dezena de metros, ladeado por 4 bodisatvas de cada lado que estavam virados para uma parede com milhares de pequenos budas dentro de armários de vidro... A nossa escala de espanto rebentou no vermelho e não conseguiamos dizer mais nada...

Yushu acabou por ser uma das melhores surpresas desta viagem e o esforço de ter vindo aqui foi largamente recompensado. Para quem como eu procura experiências autênticas, tive o prato cheio. Amanhã (quinta-feira) apanho um autocarro para Chengdu e vai ser outra viagem daquelas mas valeu a pena...

Musica para os ouvidos...

Depois das cenas das bombas de carnaval, acabei por ir parar a um jardim. Vi uma multidao e resolvi investigar. Era um espetaculo feito com pequenas chinesas dos 4 ate ao 10 anos, que tocavam harpa tradicional chinesa. Foi absolutamente incrivel ver aquelas pequenas chinesas, algumas com o fato tradicional, outras tao pequenas que nao chegavam com os pes ao chao, todas pintadas, com unhas de metal a tocar esse instrumento tao bizarro em coro... Fui totalmente surpreendido e acabei por ficar la duas horas a ve-las tocar. :)

Bombas para a sorte...

Xining, acabou or ser uma cidade interessante... Um habito incrivel que os chineses tem por aqui e' rebentar bombas de carnaval para dar sorte. Mas e' a toda a hora e com um intensidade incrivel ! Eu estava a passar a' frente de um hotel, e a noiva preparava-se para sair, quando gravei esta cena. Isto continuou uma boa meia hora, (os noivos vao ter muita sorte) mas como eu prezo os meus ouvidos, fui-me embora... :)

Knock knock on Tibete door...

... mas as portas estão fechadas. Para ser mais correcto, não estão fechadas mas demora demasiado tempo a abri-las. O meu plano era apanhar o comboio para Lhasa em Xining e depois tentar chegar a Chengdu. Eu sempre soube que era preciso uma autorização especial para viajar para Lhasa, mas pensava que obtê-la era apenas uma questão de dinheiro... Em Lisboa tentei contactar a CITS (China International Travel Service) mas não obtive resposta. Em Xining arranjam-me essa autorização, só que lutar contra a burocracia chinesa demora no mínimo 10 dias!

Ora tempo para estar parado 10 dias em Xining é que eu não tenho... Se eu tivesse 6 meses de viagem, talvez, assim tive de encontrar outra alternativa. O plano agora passou a ser o seguinte: Vou chegar a Chengdu, aproximando-me o máximo possível da fronteira do Tibete, para conseguir na mesma entrar em contacto com a cultura tibetana...

Esta opção tem o potencial de transformar esta contrariedade numa oportunidade, porque permite-me entrar do contacto com a cultura tibetana, na sua forma mais autêntica e menos diluída...

Por outro lado isso implica que eu esteja disposto a ir para a região mais remota, da província mais remota, onde os turistas não têm hábito de ir... Os avisos que tenho recebido são, de levar dinheiro e comida, e preparar-me para estradas más, cães vadios, e imprevistos...

Já tenho um bilhete de autocarro para Yushu, perto da fronteira, depois logo se vê...

sábado, 8 de agosto de 2009

Ola.:-)

A caminho de Xining... Tirei um ponto GPS por aqui. Chama-se algures no meio de nenhures. Tenho andado a actualizar o mapa, ali do lado direito graças à ajuda do meu irmão. Obrigado Cláudio.:-)

Muitos quilómetros feitos...

... e outros tantos por fazer. Estou a escrever esta entrada no diário, numa viagem de autocarro entre Dunhuang e Xining. Nos últimos dias fiz muitos milhares de quilómetros. Nem sei quantos...

Decidi ir para Xining, para fazer a minha aproximação ao Tibete. Não quero cometer o mesmo erro que fiz na minha viagem à américa do sul. Chegar a La Paz, a 4000 metros, vindo directamente do nível do mar... Fiquei doente com o mal de altitude e tive de descer, para aclimatizar, e depois voltar a subir.

Nesta viagem para Xining já tive passagens a 3700 metros e já comecei a sentir aquela estranha dor de cabeça. Xining fica a 2200 metros, a altitude ideal para aclimatizar e depois tentar apanhar o comboio para Lhasa que tem passagens a mais de 5000 metros!

A paisagem nesta viagem tem sido de cortar a respiração... Literalmente por causa da altitude, mas também como metáfora, pelas suas planícies deserticas sem fim, polvilhadas com alguns picos nevados e vegetação rasteira (a altitude não perdoa). Agora que a noite caiu, como diria Pessoa, tenho "febre" e escrevo, só que em vez de ser à luz das lâmpadas eléctricas da fábrica é debaixo da luz de uma lua cheia gigantesca...

A razão de eu ter feito estes milhares de quilómetros, entre Xian e Dunhuang, teve como objectivo ir ver as grutas de Mogao, mas não só... As grutas só por si, valeriam o esforço. Elas são, como arte budista, únicas no mundo. Melhor inclusive que as grutas dos Longmen e por isso também património mundial. A razão é que as grutas são maiores, e protegeram as estátuas da luz e dos elementos. Todas elas possuem ainda a sua pintura original. A fotografia é totalmente interdita por causa dos flashes e só se entra nas grutas acompanhado com lanternas ou luz controlada, para proteger a tinta...

A outra razão foi de ordem simbólica. Assim como Xian foi em tempos considerada a porta de entrada na rota da seda, Dunhuang era a porta de saída para os países a ocidente, isso porque ao ser um oasis no meio do deserto, fazia com que grande parte das rotas passassem por lá. Daí também, os monges terem escolhido, Dunhuang, para a localização das grutas.

Portanto ir para Dunhuang foi o acto simbólico de repetir o trajecto que as caravanas de camelos faziam para levar a seda que iria vestir os reis e as princesas do ocidente...

Passando da História, para as pequenas histórias, esta noite também teve a sua... Paramos durante a noite numa pequena aldeia do deserto. Uma adolescente entra no autocarro e instala-se. Mesmo antes de ele partir chega a família toda dela. Pai, mãe, irmãos, primos, eu sei lá... A mãe usa o lenço muçulmano. É a confusão dentro do autocarro. O pai berra, a mãe berra, deduzo que não querem que ela vá. A pequena resiste, a coisa azeda. Subitamente estão uns a puxar-lhe as pernas, outros os braços e ela agarrada aos bancos a gritar. Conseguem-na tirar do autocarro à estalada, e partimos sem ela. Parece-me óbvio que a pequena ia a fugir de casa, mas não teve sorte. Talvez para a próxima...

As grutas de Mogao

Tive de deixar a máquina fotográfica na entrada mas não me confiscaram o telemóvel. Como ele é discreto, silencioso e não emite luz, achei que não havia mal em surripiar algumas imagens.:-)

A rota da seda...

A caminho de Dunhuang... O oasis fica mesmo atrás daquela duna.:-)

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Leituras de viagem

"Amo as horas sombrias do meu ser
em que os meus sentidos se aprofundam;
nelas encontrei, como em velhas cartas, o meu dia-a-dia já vivido,
ultrapassado e vasto como numa lenda.

Elas me ensinam que possuo espaço
para uma intemporal segunda vida.
E por vezes sou como a árvore
que madura e rumorosa, sobre uma campa
cumpre o sonho que a criança de outrora
(abraçada por suas cálidas raízes)
perdeu em tristezas e canções."
Rainer Maria Rilke

"A única verdadeira jornada é caminhar para dentro de si"
Rainer Maria Rilke

"Eu estive em todos os lugares e só em mim mesmo me encontrei."
John Lennon

"Não vás para fora, volta a ti. No interior do ser humano habita a verdade."
Santo Agostinho.

"Conhece-te a ti mesmo, e conhecerás o universo com tudo o que existe."
Sócrates

"O que vai para fora depende das coisas exteriores. Quem vai para dentro encontra em si tudo que procura."
Lao tze

A torre do tambor

No final do dia a chuva parou... Fiz como os caracoís. Coloquei as antenas de fora e saí de casa. Xian tem no centro da cidade duas torres que datam do século V. A torre do sino, e a torre do tambor. A torre do sino marcava a alvorada, enquanto a torre do tambor marcava o crepúsculo. Resolvi lá passar e dar as boas vindas à noite...

O hotel onde estou em Xian.

É o que faz um dia de chuva sem nada para fazer... É uma chuva de posts:-)

Miam miam...

Uma boa surpresa em Luoyang:-)

O caminho dos soldados

Hua Shan, pico oeste

Hua Shan e Longmen

Comecei a ficar demasiado confiante nas minhas habilidades com a língua chinesa, mas aconteceram duas coisas que me trouxeram de volta à realidade. Primeiro, perdi o meu livro de vocabulário essencial, e segundo, aventurei-me na China rural, porque queria subir a uma das 5 montanhas sagradas taoístas chinesas e escolhi Hua Shan.

No sopé da montanha existe apenas uma pequena aldeia e aqui a barreira da língua torna tudo uma aventura, como o simples acto de pedir algo para comer... Nunca se sabe ao certo o que vai aparecer. Num dos restaurantes reparei que tinham cobra no menu, mas decidi pedir algo com camarões. Vieram com uma bolacha de farinha e confettis coloridos de açúcar por cima!? Enfim...

No templo de Shaolin conheci uma juíza israelita, e um casal de holandeses. A Madelong era webdesigner, e o Fred construía aceleradores de partículas (!?!!). Na 6feira fui visitar as grutas dos Longmen perto de Luoyang com eles e depois resolvemos no fim de semana subir à montanha de Hua Shan juntos, mas como no domingo estava a chover eles desistiram e acabei por subir sozinho...

As grutas dos Longmen são um espectáculo de escultura budista. Património mundial da unesco, foram escavadas durante 200 anos, há 2500 anos atrás, numa falésia do rio Yi Hé. Mais de cem mil estátuas foram esculpidas na rocha tornando este lugar único no mundo. As estátuas representam Buda e outros bodhisattva (seres iluminados). A escala de algumas com várias dezenas de metros, é o suficiente para invocar o espanto...

Hua Shan é um cenário natural de sonho, com 5 picos (norte, sul, este, oeste e central) sendo o pico sul o mais alto com 2160 metros. A montanha está coberta de árvores com mais de mil anos, e com uma flora e fauna muito diversa. Existem vários templos taoístas espalhados pela montanha mas nunca esperei que um treking aqui pudesse ter uma natureza espiritual. A razão é que a israelita preveniu-me que as excursões a partir de xian, chegam à montanha às 13h e o engarrafamento de turistas chineses começa...

Resolvi por isso passar a noite na aldeia e começar o treking pela montanha cedo para ter alguma paz e sossego. Comecei às 8h da manhã, corri os picos todos e acabei de descer o "caminho dos soldados" às 2h da tarde. Resolvi descer e não subi-lo porque só o nome mete respeito e ele tinha realmente partes verticais. Mas isso não parecia impedir pequenas chinesas com 7-8 anos de subi-lo calçadas com havaianas...

Hoje (2feira) estou em xian e ainda bem que está a chover, porque resolvi me dar um dia de descanso sem fazer nada. (estou todo partido do treking!). Consegui encontrar uma livraria que vendia o livro que perdi, por isso estou de volta à aprendizagem. Amanhã vou ver o exército de terracota e na 4feira apanho o comboio para o deserto (Dunhuang) a ver se escapo finalmente a esta chuva...

Xeque mate!

Xadrez Chinês (xiangqi) em Luoyang. Por todo o lado se vêem chineses a jogar, xadrez, majhong, cartas. Costumam estar nas ruas, nos jardins e jogam sempre a dinheiro!

Pedra num templo budista.

Há quem consiga ler isto...

Panorama das cavernas.

Aqui consegue-se ver um panorama das cavernas. O primeiro vídeo foi feito na zona central.

As cavernas dos Longmen.

sábado, 1 de agosto de 2009

O Templo de Shaolin

Alguém me disse que o meu grito de regateio não era exactamente como o dos monges de Shaolin. Resolvi tirar isso a limpo... Apanhei um comboio para Song Shan, uma região no centro da China, para conhecer o único, o famoso, o verdadeiro templo de Shaolin... O kungfu foi inventado ali, por isso imaginei que os monges me poderiam ensinar para além do grito, alguns truques... O templo ainda lá está e é absolutamente belo! Com jardins cheio de árvores milenares e grandes piras cheias de incenso a arder, mas os monges foram quase todos embora. Ficaram apenas alguns, com uma escola de kungfu onde os putos chineses podem aprender a arte e demonstra-la aos turistas curiosos como eu que por ali passam.

Num dos jardins existe a "pedra sombra". Reza a lenda que um monge indiano de nome Damo, chegou ao templo no século V, e que lhe foi negada a entrada. Resolveu por isso retirar-se numa caverna e meditar durante 9 anos, para conseguir a atitude mental correcta que lhe permitisse entrar no templo. De tanto meditar virado para a parede, a sua sombra ficou gravada na rocha... Para descansar de tanta meditação o monge imitava animais como o tigre ou o escorpião e essas posições evoluíram para a arte marcial de Shaolin.

Durante a demonstração assisti a algo nas fronteiras do verosímel... Um monge a atirar uma agulha contra um vidro e rebentar um balão do outro lado... Verdade ou magia?

A China comunista...

Se eu não soubesse história e alguém me dissesse que a China foi em tempos um país comunista, seria muito difícil acreditar... Tirando a arquitectura dos edifícios oficiais que lembram essa era, não existe propaganda ideológica em lado nenhum. Cartazes, slogans, panfletos, todos desapareceram, foram arrancados ou pintados por cima. Aquilo que de mais parecido vi como uma mensagem ideológica, foi um filme antigo que passou numa viagem de avião para Beijing. O enredo era um grupo de pessoas que trabalhavam numa quinta agrária e que lutavam pelo seu direito à educação...

Hoje, essas mensagens foram substituídas por anúncios comerciais de toda a espécie. A iniciativa privada é a regra e há um materialismo evidente nos carros alemães, ou coreanos topos de gama que os homens de negócio conduzem ou nos telemóveis de última geração que os putos usam no metro.

Nota-se claramente que a China é um país em transformação acelerada. Por todo o lado se vêem pontes, estradas e prédios em construção. A rapidez dessa mutação faz com que se vejam coisas de primeiro mundo a conviver lado a lado com outras de terceiro mundo. Como se a China no seu despertar tivesse dado um salto sem passar pelo segundo...

O modelo de desenvolvimento é claramente uma cópia do modelo ocidental, a única diferença é o modelo de governação. A presença do partido no entanto não se faz notar. Tirando uns militares à porta dos edifícios oficiais ou em lugares sensíveis como a praça de tiannamen. Existem câmaras de vídeo por todo o lado, e as bagagens são passadas a raio-x em todos os meios de transporte, mas isso não faz Beijing diferente de, por exemplo, Londres...

A primeira impressão é a de que os chineses gozam de uma extensa liberdade e que as restrições à internet que eu sinto, a eles não lhes diz nada ou podem bem viver com isso. As restrições que eu sinto também são relativas. É certo que se eu tentar aceder através de um sítio oficial fotocopiam-me o passaporte e tiram-me as medidas, mas já reparei que pelo menos em Beijing existem redes sem fios abertas por todo o lado, em cafés, restaurantes, hotéis, portanto não preciso de me submeter a isso...

Parece existir na sociedade chinesa uma grande apatia política talvez devido ao facto de que não é preciso colocar em causa o papel do partido enquanto a vida estiver a melhorar. Essa é pelo menos a teoria dos analistas ocidentais que dizem que a China tem de crescer 8% ao ano para não ter revoluções sociais...

Não sei se isso é verdade, mas o que eu sei é que o modelo de desenvolvimento que a China copiou está obsoleto, como ficou demonstrado nesta última crise internacional. Não se pode apostar num modelo de crescimento exponencial num planeta com recursos limitados.

Li recentemente numa estatística que cada americano consumia cerca de 25 vezes mais de energia do que um chinês. Se a ambição da China é atingir o nível de vida dos americanos, isso significa que 1.3 mil milhões de pessoas (20% da população mundial) teria de consumir 25 vezes mais energia... Não é possível. O planeta não aguenta, algo vai ter de mudar... Os chineses já conseguiram mudar de um regime comunista para um capitalista sem sobressaltos, portanto não tenho dúvidas de que quando o futuro assim o impuser eles irão mudar novamente... Ou isso ou estamos todos tramados.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

... e apontar ao céu.

Vamos rodar a sorte...

Jiang Chu inicia o vôo...

Ontem saí da capital rumo ao norte para Chengde. É uma cidade que servia como retiro de verão na dinastia dos imperadores Manchu, rodeada por templos budistas e a magnífica estátua de Guanyin no templo de Puning. Ainda bem que tive oportunidade de praticar o meu chinês na capital, porque aqui acabou-se o inglês. As pessoas vêem que tu és estrangeiro mas falam-te em chinês e esperam que tu percebas. Quando vêem que tu não percebes falam-te em chinês de-va-ga-ri-nho... São simpáticos. Já começo a conseguir perceber umas palavras aqui e ali. Houve um chinês que estava a falar para mim e pelo meio percebi um ni, um guo, e um ma. Tu, reino, pergunta. Ele estava a perguntar de que país é que eu era! Ao qual eu exclamo, pú tä ya! (Portugal em chinês) e ele fez um grande sorriso de reconhecimento... Fiquei contente por ter tido a minha primeira conversa em chinês:-)

Chengde

Estou em Chengdé, a norte de Beijing. Eu pensava que só os Beijing Ren é que sabiam se divertir... Isto foi ontem à noite (terça) numa rua de Chengdé.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Uffa:-).

Se quiserem saber, em que zona da muralha este vídeo foi tirado, tirei um ponto gps que tenho andado a actualizar graças ao meu irmão... Ali na barra da direita - onde andas Jiang Chu.

A grande muralha

A grande muralha foi uma experiência top! Tinha medo de experimentá-la com o mar de gente que tenho visto nos outros pontos turísticos. É difícil apreciar algo com pessoas a empurrar e putos a berrar. Encontrei uma agência que organizava um treking de 10km numa zona remota da muralha. Pensei: só os maluquinhos é que pagam para andar 10km, para cima e para baixo debaixo de um calor abrasador... Então inscrevi-me.

Acertei em cheio! Éramos pouco mais de uma dúzia de maluquinhos ocidentais com outros tantos chineses a tentar nos vender garrafas de água. O treking até se fez bem, mas houve partes complicadas, tão ingremes, que era praticamente escalada, onde tínhamos de usar as mãos transformados numa máquina de suor...

Quando se sente as pernas a tremer do esforço de percorrer apenas 10km da muralha é que se consegue dar valor ao esforço dos chineses terem construído quase 3000km da mesma...

O Jiang Chu abre as asas...

Já começo a sentir alguma confiança no meu chinês... Abordo os vendedores de rua sem problemas e regateio com os condutores de ricshaw. A minha técnica é muito simples. Começo com um - duo shao xian (quanto é?) eles dizem o preço (já sei os números) e depois dou-lhes com a minha arma secreta, uma exclamação sonora, tipo monge shaolin - OOoooaaaAAHhh!! - seguido de uns - bu shi, bu shi, (nada disso, nem pensar). Eles primeiro ficam muito admirados, depois partem-se a rir, e baixam o preço, nunca falha...

A minha confiança faz com que experimente comidas mais exóticas... E é claro que isso já implicou um primeiro desarranjo intestinal. Tentei identificar qual o prato culpado, mas não consegui. Ainda desconfiei dos escorpiões que comi ao jantar, mas não pode ter sido, porque o homem garantiu-me que eram fresquinhos... (mãe, estou a brincar!). Mas sem problemas, nada como umas verduras para restabelecer o feng shui intestinal... Como (ainda) não sei ler chinês, escolho os pratos apontando para as imagens dos menus. Escolhi um com verduras verdes e vermelhas que pareciam apetitosas, quando o prato chegou, afinal eram pimentos e malaguetas...

Uma vista do palácio.

O palácio de verão...

O palácio de verão do imperador, em Beijing, é um verdadeiro tributo ao ócio... Um lago enorme rodeado de um jardim, cheio de pavilhões, portas e átrios. Fez-me pensar que no ocidente, não damos suficiente valor ao tempo que estamos sem fazer nada... É claro que não somos todos imperadores com um séquito a trabalhar para nós, mas às vezes usamos o nosso tempo livre para estarmos ocupados a fazer outras coisas, em vez de deixarmos a mente vaguear e cultivarmos uma sensibilidade que nos permita significar o mundo...

Imaginem que pediamos a alguém, com uma sensibilidade crua, (mas preocupado com a produtividade e eficiência) que desse nome às portas e aos átrios. Provavelmente teríamos a porta 27A, ou o átrio 47E... Coisas que até poderiam ser muito úteis, mas que não significam nada...

Mas o imperador não, ele tinha tempo para significar o seu mundo e enchê-lo de poesia... Assim temos, o jardim da virtude e da harmonia, a porta das nuvens dispersas, o átrio das ondas de jáde, a porta da nuvem púrpura, a porta de convidar a lua, o átrio das virtudes celebradas, o jardim dos interesses harmoniosos, a torre da fragância do buda, o pavilhão dos desejos esquecidos e das nuvens acompanhantes, o pavilhão da clareza e do descanso e o átrio da serenidade...

Digam lá se isto assim não fica tudo muito mais bonito!

sábado, 25 de julho de 2009

O camarada Mao...

... na porta da paz celestial.

Beijing ren a dançar...

Beijing Ren

Beijing é absolutamente enorme... Para dar uma idéia, a área municipal de beijing é mais ou menos do tamanho da bélgica! É claro que a cidade é mais pequena mas mesmo assim... Como é impensável percorrê-lá a pé (a menos que eu queira passar 8h por dia a andar sem ir a lado nenhum), armei-me de uma bicicleta e fiz-me à estrada.:-) Sim, porque beijing é plana como uma tábua de majhong. Fora dos hutöngs o trânsito é caótico, mas existem ciclovias, quando tenho dúvidas sobre os sinais de trânsito sigo as outras bicicletas... O objectivo hoje era ir até à cidade proibida e à praça de tiananmen. Pelo caminho fui parando em parques e jardins à procura dos beijing ren, ou em português, de como vivem os habitantes de beijing um sábado à tarde... O que vi confirmou a atmosfera dos hutöngs. As pessoas aqui, gostam de apreciar a vida. Não tem nada a ver com a correria desenfreada de xangai. Nos parques os beijing ren, dançavam, tocavam, escreviam no chão a arte dos caracteres chineses com água, recitavam poesia, jogavam majhong... Nem sequer se importavam de um laowai (estrangeiro) lhe estar a espreitar o jogo e a tirar umas fotos:-)

Quando cheguei à cidade proibida estava lá um ren hai (mar de gente) e aprendi hoje a dizer - wo xiang yi ping shui. (eu quero uma garrafa de água!). Andar 5 horas dentro de uma cidade dentro da cidade, com um sol abrasador é obra... A arquitectura é absolutamente espantosa, e todos os palácios tem o seu significado e a sua história... Algumas com argumentos épicos, como a da menina chao, filha de uma família muito pobre, que foi comprada por um eunuco para trabalhar na corte imperial, e que sabia mais de mil poemas, um dia o imperador ouviu-a recitar poesia e apaixonou-se, e fez dela a sua concubina favorita, provocando a inveja de todas as outras, quando ela teve um filho do imperador, as outras encontraram forma de o enviar para longe, ela chorou tanto que dizem que ficou cega, e quando o imperador morreu, ela ficou sozinha, mas o novo imperador morreu sem deixar filhos e após discussão na corte decidiram fazer do neto dela imperador, fazendo dela imperatriz mãe... Menina Chao pobre chega a imperatriz mãe... Digam lá se isto não dava um argumento de novela?

Pedalando nos hutöngs de Beijing...

:-)

Beijing hutöng

Já gosto mais de Beijing (Pequim), do que Xangai, mas isso está obviamente relacionado com o sítio que escolhi para ficar... A única coisa que Xangai tem de chinês ... são os chineses. O resto são arranha céus e ruas como a Nanjing. Centros comerciais a céu aberto, com as marcas do ocidente. Em Beijing estou instalado num hutöng a norte da cidade proibida. Os hutöngs são os bairros antigos da capital, que remontam à dinastia ming, casas térreas, telhados típicos, ruas estreitas, becos e vielas, chineses a andar de bicicleta, tudo muito calmo, muito pacífico, muito característico. Acho que vou ficar por cá uns dias...

quinta-feira, 23 de julho de 2009

431km/h !

rén häi

Aprendizagens...

A primeira coisa que aprendi sobre a china é que ela não está preparada para viajantes independentes que não saibam chinês, como eu... Ou se vem num tour onde haja quem fale chinês por ti, ou tens realmente de aprender algumas palavras... As primeiras palavras que aprendi a dizer foram - wo bu ming bai - que significam, não percebo nada...

Ter de aprender chinês, não é apenas uma evidência mas uma questão de sobrevivência. É raro encontrar alguém que saiba falar inglês e mesmo quando isso acontece é muito difícil percebe-los...

Tenho um livro de imagens que até certo ponto ajuda (obrigado São). Eu aponto para a imagem de um bilhete e a imagem de um comboio e eles sabem o que quero, mas não tenho nenhuma imagem para dizer: amanhã às 17h40!

Felizmente tenho outro livro com um vocabulário essencial e uns mp3 no telemóvel (obrigado Claudio) e estou por assim dizer a tirar um curso de chinês intensivo... Os meus exames são conseguir dormir, comer, viajar... Mas atenção! O meu objectivo é apenas fazer com que me percebam. Perceber o que eles dizem é outra categoria, outro universo... Acho que teria de viver cá vários anos para ter alguma hipótese...

No início a minha pronúncia era tão má, que houve um chinês que me disse - in english please - mas tenho vindo a melhorar, ao ponto de ter abordado outro chinês na rua a perguntar direções e ele para além de me apontar um caminho começa todo contente a falar-me, como se eu o percebesse, provavelmente a perguntar-me de onde venho, se estou a gostar da china, etc, mas é aí que entra o wo bu ming bai...

A segunda coisa que aprendi sobre a china é que um país com 1.3 mil milhões de habitantes é algo que tem o seu efeito no dia a dia. O metro de xangai em hora de ponta é algo de surreal... Um verdadeiro mar de gente ou em chinês - rén häi.

Já me tinham avisado que comprar bilhetes de comboio para o mesmo dia era complicado, por causa disso, (como sou esperto), tentei comprar um dia antes bilhetes para Pequim - quan mian (cheio), afinal não sou assim tão esperto... 2 dias antes? Cheio. 3 dias? Cheio. 4 dias? Cheio. Estão a ver o filme... Como não quero passar o resto das férias em xangai, apanhei o maglev para o aeroporto à estonteante velocidade de 431km/h, onde estou agora...

...

O Eclipse

A trovoada de terça-feira, transformou-se em céus cor de chumbo para o dia do eclipse... Eu sempre soube que isto podia acontecer. Julho é dos meses mais chuvosos na região, mas continuava a ser o melhor sítio na linha da totalidade e o que tinha as melhores hipóteses, mas tal não aconteceu... Consegui na mesma escapar à chuva de xangai e fiz 150km para sul para haining, para vê-lo em yuanguang, onde existe um fenômeno de onda de maré que por coincidência seria poucas horas depois do eclipse. Esperava-se que a onda fosse muito maior que o normal devido devido ao alinhamento da lua e da sua proximidade. E acabou por ser um verdadeiro tsunami com hora marcada... Quanto ao eclipse vi-o à beira da estrada a caminho de yuanguang, isto porque o táxi que partilhei com dois americanos na estação de comboio de haining, tinha 3 rodas, 1 mudança e não dava mais de 30km/h. Uns minutos antes da totalidade mandamo-lo encostar e preparamo-nos para o evento. Apesar do céu nublado acabou por ser uma experiência incrível. Continuou a haver luz, até poucos segundos antes da totalidade e depois é uma queda abrupta. Em segundos passamos para uma noite muito escura e silenciosa. A vida ficou suspensa durante mais de 5 minutos. O silêncio apenas interrompido pelas exclamações de espanto... E tão rápido como começou, terminou, quando a luz reapareceu em segundos e tudo voltou à normalidade... É um espetáculo que nos faz sentir muito pequenos e humildes perante a grandiosidade da dança dos planetas e percebemos através desta súbita interrupção solar, o milagre que é o simples facto de o sol se levantar todos os dias... Agora só me resta planear o próximo.:-)

terça-feira, 21 de julho de 2009

Nanjing Road, Xangai

Um calor insuportável... E subitamente POW rebenta uma trovoada... Nanjing é um centro, e a minha base de exploração da cidade.

Quero agradecer os mails que recebo. É muito bom saber que trago os amigos na bagagem :-)

The Bund

Houston, the Eagle has landed...

40 anos depois do homem aterrar na lua eu aterro em Xangai. É claro que Xangai não é a lua nem eu sou o Amstrong, mas parece na mesma outro planeta.

Os ETs não me percebem, ou então sou eu o ET porque não os percebo. Nem os gestos são iguais, por isso fazer de mimo também não ajuda. Ainda bem que aprendi a dizer Tsingtao (marca de cerveja) assim pelo menos já não morro à sede.

Xangai prepara-se para a expo 2010 e parece um enorme estaleiro. Por todo o lado andaimes, picaretas, gruas, ferro, cimento e pó. Estão 40 graus de uma humidade peganhenta, por tudo isto o trekker que há em mim prefere manter-se à sombra.

Já sabia que a China tinha a "great wall" mas só agora descubro a "great firewall". Só posso aceder à net com passaporte, tudo deve estar a ser monitorizado, o facebook e o blogger estão bloqueados. Ainda bem que posso fazer actualizações do blog por mail senão o meu plano de um diário ia por água abaixo... Se me quiserem dizer alguma coisa, tem de ser por mail para o rui (arroba) gil (ponto) com porque nao consigo ver o meu proprio blog !!!

domingo, 19 de julho de 2009

quarta-feira, 15 de julho de 2009

A anarquia é uma estética

“Fotografar é prender a respiração quando todas as nossas faculdades se conjugam diante da realidade fugidia; é neste momento que a captura da imagem é uma grande alegria física e intelectual.
Fotografar é pôr na mesma linha de mira a cabeça, o olho e o coração.
Fotografar é um meio de compreender que não pode ser separado dos outros meios de expressão visual. É uma maneira de gritar, de libertar-se, não de provar nem de afirmar a sua própria originalidade. É uma maneira de viver.
A fotografia "fabricada" ou encenada não me diz respeito. E se emito um julgamento, será de ordem psicológica ou sociológica. Há quem faça fotografias previamente arranjadas e há os que vão à descoberta da imagem e a captam. A máquina fotográfica é para mim um bloco de esboços, o instrumento da intuição e da espontaneidade, a senhora do instante, que, em termos visuais, questiona e decide ao mesmo tempo. Para "significar" o mundo, é preciso sentir-se implicado no que se descobre através do visor. Esta atitude exige concentração, uma disciplina de espírito, sensibilidade e um sentido de geometria. É mediante uma grande economia de meios que se chega à simplicidade de expressão. Deve-se sempre fotografar com o maior respeito ao objecto e a si mesmo.

A anarquia é uma estética.

O budismo não é, nem uma religião, nem uma filosofia, mas um meio que consiste em dominar o espírito para alcançar a harmonia, e pela compaixão, oferecê-la aos outros”

Henri Cartier-Bresson in "O imaginário segundo a natureza".

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Where the hell is Matt?



Este é o Original.. Esta é a versão revista e aumentada.

Onde andas Jiang Chu ?



quinta-feira, 2 de julho de 2009

Le soleil, la lune et le ciel...



Esta noite sonhei com um eclipse...
Tu est la mer, je suis le ciel
On ne se touche que à l'horizon
Mais on se touche...

Je te donnes la lune est le soleil
Tu me donnes le dauphin, et les poissons,
Merci pour ta bouche...

O Sal da língua...

«Escuta, escuta: tenho ainda
uma coisa a dizer.
Não é importante, eu sei, não vai
salvar o mundo, não mudará
a vida de ninguém - mas quem
é hoje capaz de salvar o mundo
ou apenas mudar o sentido
da vida de alguém?
Escuta-me, não te demoro.
É coisa pouca, como a chuvinha
que vem vindo devagar.
São três, quatro palavras, pouco
mais. Palavras que te quero confiar,
para que não se extinga o seu lume,
o seu lume breve.
Palavras que muito amei,
que talvez ame ainda.
Elas são a casa, o sal da língua.»

Eugénio de Andrade

Mandala

"we need to live in a state of suspended animation, like a work of art; in a state of enchantment... detached... detached... "


The Certainty of Chance



A butterfly flies through the forest rain
And turns the wind into a hurricane
I know that it will happen
’cause I believe in the certainty of chance

A schoolboy yawns, sits back and hits return
While round the world computers crash and burn
I know that it will happen
’cause I believe in the certainty of chance

And I believe
I can see it all so clearly now
You must go and I must set you free
’cause only that will bring you back to me
I know that it will happen
Because I believe in the certainty of chance

Sometimes at night the darkness and silence weighs on me. peace frightens me. perhaps I fear it most of all. I feel it’s only a facade, hiding the face of hell. I think of what’s in store for my children tomorrow; the world will be wonderful, they say; but from whose viewpoint? we need to live in a state of suspended animation, like a work of art; in a state of enchantment... detached... detached...

domingo, 28 de junho de 2009

You are Home, where I want to go, Home..

Tanto caminho, tanto caminho...

... quando na verdade andamos à procura de uma casa.

Uma casa que fosse um areal
deserto; que nem casa fosse;
só um lugar
onde o lume foi aceso, e à sua roda
se sentou a alegria; e aqueceu
as mãos; e partiu porque tinha
um destino; coisa simples
e pouca, mas destino:
crescer como árvore, resistir
ao vento, ao rigor da invernia,
e certa manhã sentir os passos
de abril
ou, quem sabe?, a floração
dos ramos, que pareciam
secos, e de novo estremecem
com o repentino canto da cotovia.

Eugénio de Andrade

O Caminho...


O Tao () significa "caminho" ou "via"... O cabeçalho deste blog, representa portanto, o caminho pelo reino do meio (道中国).

Partida para o oriente

Existe um compasso de esperas, entre a partida e o teu olhar de pássaro coberto de medo, existe um tempo inexacto, na aridez indefinida de um adeus, vejo-te com a mão branca de nuvem, em aceno sombrio, estou de partida para uma terra invisível e verde, tudo o que eu disser são lábios de água, tudo o que eu disser é uma memória inanimada (mas digo), procura uma forma não inventada, procura uma ave frágil que seja o lugar da ausência no coração, um segredo sussurado no abraço das tardes, um corpo repleto de mágica violência, ignoro a distância que tenho entre o sangue e a água, ignoro se a luminosidade das velas pandas me susterá, mas o vento acende-se e os teus olhos apagam-se, vejo o barco inclinar-se em excessos de água, insinua-se um verbo imperfeito, e as nuvens brancas rasgam os tecidos da inevitável despedida...

Tao

道可道,非常道。
(o caminho que pode ser descrito, não é o verdadeiro caminho)

名可名,非常名。
(o nome que pode ser nomeado, não é o verdadeiro nome)

Zhong Guo

(Meio) (Reino) Ou China para os amigos, em chinês simplificado e tradicional.

Night Hawks


Night Hawks, Edward Hopper, 1942

A poesia das partidas

«Num ensaio sobre o poeta, T.S. Eliot sugeria que Baudelaire foi o primeiro artista do século XIX que soube dar expressão à beleza dos lugares de passagem e dos meios de transporte: Baudelaire... inventou uma nova espécie de nostalgia romântica, escreveu Eliot, a poésie des départs, a poésie des salles d'attente.
(...) 
Por vezes Baudelaire sonhava ir a Lisboa. Aí faria mais calor e ele, estendido ao sol, como um lagarto, ganharia novo vigor. Era uma cidade de água, mármore e luz, propícia ao pensamento e à serenidade. Mas mal acarinhara ainda esta fantasia portuguesa, logo se punha a pensar que talvez fosse mais feliz na Holanda. E, afinal porque não em Java, ou também no Báltico e ainda no Polo Norte ! (...) O Essencial não era o destino da viagem. O verdadeiro desejo era o de ir-se embora, como de resto Baudelaire concluía: Qualquer sítio! Qualquer sítio! Contanto que seja fora deste mundo!»

Alain de Botton in A Arte de Viajar.

Aparentemente as influências de Baudelaire, devem ter encontrado ouvidos na cultura portuguesa, senão do que falava Agostinho da Silva quando se referia «à poesia da vadiagem» ? Ou o que queria dizer António Variações quando cantava «Só quero ir onde não vou»?

É sempre o mesmo espírito, partir, atracção pelos lugares de passagem, pelos quartos de hotel, por um efémero que ao retirar-nos o conforto de uma casa, nos põe em contacto com a uma solidão existencialista... Edward Hopper, sabia-o bem. É como se o permanente movimento, conseguisse pôr a realidade em perspectiva, torná-la relativa, e esse vazio, essa solidão, despisse os preconceitos impostos pelo quotidiano e criasse as condições para um contacto mais genuíno com o mundo...

sábado, 27 de junho de 2009

O Silencio...

... é de ouro.

Tempos interessantes

Existe um provérbio chinês, que diz: "Possas tu viver tempos interessantes". Aquilo que à partida poderia parecer uma benção, era na verdade uma maldição... Na China medieval, a única coisa que quebrava a monotonia de uma vida ligada à terra, eram as guerras ou as revoluções sociais. Pois hoje, vivemos tempos interessantes... Estamos a assistir ao final de uma ordem mundial que durou 60 anos. O final do império belo (美国, Mei Guo), como dizem os chineses quando se referem aos EUA. O final de uma relação simbiótica que criou um híbrido chamado Chimérica. Este monstro foi criado numa estranha dinâmica, onde os chineses trabalhavam e poupavam dinheiro, para emprestar aos americanos que o gastavam em produtos chineses. Se por um lado os chineses ganhavam porque vendiam os produtos, os americanos ganhavam porque viviam bem com dinheiro emprestado a juros baratos. O problema é que não se pode viver uma vida inteira a pedir emprestado, algum dia tem de se pagar... E como dizia Churchill: “The era of procrastination, of half-measures, os soothing, of baffling expedients, of delays, is coming to a close. In its place we are entering a period of consequences...”. As consequências são a falência dos EUA, o fim do dólar e da ordem mundial que ele suporta. A única dúvida é se esse fim é ordenado ou caótico. Infelizmente para todos, o facto dos EUA não aceitarem essa inevitabilidade, torna mais provável a segunda. Os chineses sabem hoje que os americanos nunca irão pagar a sua dívida, por isso estão a tentar posicionar-se, com os seus parceiros para um mundo pós-dólar. A "nova ordem mundial" publicitada na última reunião dos G20, pelos EUA e pelo Reino Unido, não é mais do que tentar aplicar uma camada de tinta em cima de um terramoto, é mais do mesmo, e é por isso a China e outros se preparam para a nova "nova ordem mundial". Os chineses já pediram várias vezes a criação de uma nova moeda que substitua o dólar, para tentar um fim ordenado. Ninguém no mundo ocidental os ouve, e é isso que aumenta as probabilidades do fim ser caótico. Quando é que isso irá acontecer ? Alguns dizem que será, este verão, mas ninguém sabe ao certo...

O movimento...

A vizinha do quarto andar sabe que vou viajar e perguntou-me se eu não me cansava do movimento, fez a pergunta sem conseguir evitar um tom de reprovação gentil, a condescendência dos anos perante a inquietude dos mais novos, queria responder-lhe, mas pensei se era possível estar quieto como uma rocha, não será o movimento a natureza fundamental das coisas e todo o carácter estático dos objectos apenas uma ilusão, Heraclito dizia há dois mil anos que não podes tomar banho duas vezes no mesmo rio, que tudo é devir, Buda há mais tempo dizia que tudo é impermanência e vazio, se eu ficasse quieto e não lhe respondesse não continuaria o meu coração em movimento, e se este parasse não seria a minha quietude traída pelos ponteiros do meu relógio, deste e de todos os relógios do mundo que nos impedem de ficarmos quietos no passado, mundo este que cruza o espaço a velocidades inimagináveis com todos os outros planetas e estrelas, posso olhar para uma cadeira e pensar que ela está quieta mas se eu lhe deitar fogo não se transformará ela em cinza, como é que algo que não consegue permanecer pode estar quieto, toda a minha vida estive em movimento e quando morrer não vou parar porque não posso, porque me vou transformar em terra ou em fumo, e depois noutras tantas coisas como árvores ou nuvens, nem sequer as rochas estão quietas, elas movem-se só que muito devagarinho, tudo é movimento, é a nossa natureza fundamental, por isso sorri-lhe e disse, não, não me canso, e fui-me embora...

sexta-feira, 26 de junho de 2009

O espírito do viajante...

«Viajar é um acto de responsabilidade social. Em muitos casos, a minha atitude terá mais peso na teia de relações económicas entre povos do que os discursos de boas intenções de embaixadores e comitivas oficiais. Se eu decidir ficar a dormir em pequenos hotéis de condução familiar, sei que os meus euros serão inseridos na economia local e estão a ser canalizados para o desenvolvimento do país que me recebe. (...) Marco Polo soube descrever "as maravilhas do mundo" com humildade, tolerância, pasmo e exactidão. Não se encontram sinais de soberba, de arrogância, de superioridade religiosa ou de escárnio cultural no seu olhar. É essa a lição eterna e universal de Marco Polo. Viajar serve para nos descobrirmos a nós próprios e à civilização a que pertencemos, através dos outros e das civilizações a que pertencem.» 

Gonçalo Cadilhe in A Lua pode esperar