sábado, 8 de agosto de 2009

Muitos quilómetros feitos...

... e outros tantos por fazer. Estou a escrever esta entrada no diário, numa viagem de autocarro entre Dunhuang e Xining. Nos últimos dias fiz muitos milhares de quilómetros. Nem sei quantos...

Decidi ir para Xining, para fazer a minha aproximação ao Tibete. Não quero cometer o mesmo erro que fiz na minha viagem à américa do sul. Chegar a La Paz, a 4000 metros, vindo directamente do nível do mar... Fiquei doente com o mal de altitude e tive de descer, para aclimatizar, e depois voltar a subir.

Nesta viagem para Xining já tive passagens a 3700 metros e já comecei a sentir aquela estranha dor de cabeça. Xining fica a 2200 metros, a altitude ideal para aclimatizar e depois tentar apanhar o comboio para Lhasa que tem passagens a mais de 5000 metros!

A paisagem nesta viagem tem sido de cortar a respiração... Literalmente por causa da altitude, mas também como metáfora, pelas suas planícies deserticas sem fim, polvilhadas com alguns picos nevados e vegetação rasteira (a altitude não perdoa). Agora que a noite caiu, como diria Pessoa, tenho "febre" e escrevo, só que em vez de ser à luz das lâmpadas eléctricas da fábrica é debaixo da luz de uma lua cheia gigantesca...

A razão de eu ter feito estes milhares de quilómetros, entre Xian e Dunhuang, teve como objectivo ir ver as grutas de Mogao, mas não só... As grutas só por si, valeriam o esforço. Elas são, como arte budista, únicas no mundo. Melhor inclusive que as grutas dos Longmen e por isso também património mundial. A razão é que as grutas são maiores, e protegeram as estátuas da luz e dos elementos. Todas elas possuem ainda a sua pintura original. A fotografia é totalmente interdita por causa dos flashes e só se entra nas grutas acompanhado com lanternas ou luz controlada, para proteger a tinta...

A outra razão foi de ordem simbólica. Assim como Xian foi em tempos considerada a porta de entrada na rota da seda, Dunhuang era a porta de saída para os países a ocidente, isso porque ao ser um oasis no meio do deserto, fazia com que grande parte das rotas passassem por lá. Daí também, os monges terem escolhido, Dunhuang, para a localização das grutas.

Portanto ir para Dunhuang foi o acto simbólico de repetir o trajecto que as caravanas de camelos faziam para levar a seda que iria vestir os reis e as princesas do ocidente...

Passando da História, para as pequenas histórias, esta noite também teve a sua... Paramos durante a noite numa pequena aldeia do deserto. Uma adolescente entra no autocarro e instala-se. Mesmo antes de ele partir chega a família toda dela. Pai, mãe, irmãos, primos, eu sei lá... A mãe usa o lenço muçulmano. É a confusão dentro do autocarro. O pai berra, a mãe berra, deduzo que não querem que ela vá. A pequena resiste, a coisa azeda. Subitamente estão uns a puxar-lhe as pernas, outros os braços e ela agarrada aos bancos a gritar. Conseguem-na tirar do autocarro à estalada, e partimos sem ela. Parece-me óbvio que a pequena ia a fugir de casa, mas não teve sorte. Talvez para a próxima...

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